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segunda-feira, setembro 16, 2013

Pyton


Eu guardava o antigo oráculo junto à fonte do bosque de loureiros ao pé do monte. Eu nasci da própria Geia profunda. Eu descia até a caverna-útero para escutar as sombras e guiar os viajantes. Porque todos precisam de uma luz escura. Essas deusas de coxas duras gritavam e dançavam ao som de Dionísio, mas ele as ensinou regras e proporções. Como paga, o furioso mestre da memória - dos adivinhos que olham além e sabem o que foi, o que é, o que será - exigiu o jogo, o recitar da poesia, a cítara e a flauta, som de meninos em roda no altar. 

Dizem que eu persegui Leto, grávida dos gêmeos, e por isso ele feriu-me com setas de prata e de minha pele fez um trono para uma nova profetiza. A verdade é que queriam por fim à palavra de Geia e estabelecer uma nova palavra. Com lógica nova, colocam cada um em seu lugar. Com a retórica de evitar a vaidade do combate e a ganância do comércio, pregam a austeridade, a disciplina, a severidade para consigo mesmo, a fuga do prazer e o esforço ascético. Sua razão de ouro é falsa, magia negra. 

Não acreditam mais que devem pagar tributo à Noite poderosa e à vasta mata. Que o mundo exige reconhecimento, que tudo pede equilíbrio. Não pensam mais que o invisível derruba, vindo por trás, de rasteira, a alma adoece, a raiva aniquila, a sorte e o acaso podem derrubar um carro em batalha ou naufragar o belo guerreiro de mais alta linhagem. Os nobres aprendem a falar e isso lhes garante a verdade nos debates, com orgulho esmagam razões alheias. Eles podem tudo, mas não cultuam seus mortos, e os espíritos se ressentem. Eu estou ao lado da Senhora das colheiras e enlouqueço Diomedes que feriu Afrodite. Eu sou um Dragão-Fêmea e, com as Eríneas, não deixo o mortal dormir em paz. Eu grito nos ouvidos dos criminosos continuamente seus crimes e faço com que sua vida perca o sentido. 

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O trabalho Pyton de Afonso Jr. Lima foi licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-SemDerivados 3.0 Não Adaptada.

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