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quinta-feira, setembro 03, 2015

Não há bombas

- Não estamos numa guerra, não é mesmo?
- Não.
- É um mundo livre, não?
- Um mundo livre, sim.
- Não estamos numa guerra.
- Não. São apenas velhos, negros, velhos negros sem oportunidade que vagam como sonâmbulos e comem arroz com as mãos.
- Não há cadáveres de crianças, estilhaços, pedaços de bombas ou ruínas.
- São apenas velhos, velhos sujos que moram embaixo de cobertores, ou papelão, que se encolhem nas calçadas em cima de papelão.
- Não há crianças mortas na praia, mutilados, ruínas ou armas apontadas. Não há bombas.
- São apenas velhos negros sem sapatos, com suas calças sujas, mancando, pedindo comida ou bebendo cachaça, pedindo comida ou bebendo.
- Não há sangue e ruínas, não há refugiados. É uma grande cidade. São prédios brilhantes. São mesmo altos, luminosos, são grandes prédios modernos e brilhantes.
- Pedindo comida. Ou carregando sacos. Ou comendo com as mãos podres restos de lixo. Ou se masturbando na esquina. Ou gritando no meio da rua. Ou catando piolhos. Velhos negros sem ocupação.

Afonso Lima

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