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domingo, outubro 30, 2016

O caso dos corpos sem nome

Os corpos apareciam boiando no rio, mas desfigurados. Como não se tinha notícias de desaparecidos, Oto, jovem universitário, decidiu investigar o caso. Havia lido inúmeros livros em que um detetive amador conseguia intuir os passos de criminosos.
Oto foi falar com o padre da sua paróquia. Ele era um estudioso de ocultismo. 
Agora o padre dizia que tinha certeza de que os mortos eram da parte invisível da cidade. 
"Você já reparou que não existem favelas nessa cidade? Quando as pessoas ocupam um terreno e começam a erguer casas miseráveis, logo o governo cria um parque e expulsa as pessoas para outra cidade. Tenho certeza de que alguma pesquisa científica está usando essas pessoas sem rosto como cobaias". 
Procurou o médico legista da cidade. O homem não era nada simpático, mas ele insistiu e pediu que contasse qualquer coisa estranha. Finalmente ele revelou duas coisas: os corpos pareciam ter marcas de violência e um deles pareceu ter um movimento vibratório na língua e na mão. 
Lembrou o que o padre dizia, que as execuções públicas tinham criado um gosto pelo grotesco entre os moradores da cidade. "A insensibilidade virou uma regra; vi um menino brincando com um corpo putrefato que foi deixado em exposição na praça" - contara certa vez. 
Oto resolveu ficar à noite próximo à cabeceira do rio. Era o lugar mais acessível para qualquer ato desses. Escondido entre as árvores, observava a lua e os sons estranhos dos animais. Não tinha sono. Mas também não tinha medo. 
De fato, viu na terceira noite um homem vestido com um sobretudo negro se aproximar de carro e puxar do porta malas um vulto dentro de um saco. Tentou ver com mais precisão, por sorte a noite tinha uma lua cheia. 
Teve a impressão de que o saco se mexia. Ele sentiu um frio na espinha. 
No outro dia, um tanto cansado, foi procurar o padre. O homem serviu-lhe um vinho e disse sussurrando: 
- Eu não tinha imaginado isso. Você sabe que estudo essas coisas há muito tempo. Os chineses já falavam sobre isso. Os egípcios aprenderam dos indianos as mesmas técnicas. Mas foi no século XVIII, na Alemanha, que um sábio começou a criar a teoria. Ele estudou em Newton o conceito de gravidade universal e postulou a presença de uma energia universal. Ele ficou famoso por curar dores com um ímã. Segundo o cientista, seria possível transformar a energia invisível do éter em força magnética e esta em força orgânica. Já há tempos alguns homens se perguntam qual o limite da morte se um corpo puder ser mantido vivo através do frio ou uma energia qualquer. Alguém voltou a estudar  do magnetismo animal. 
Oto partiu com uma sensação estranha que não sabia definir. Por que afinal ele queria saber sobre coisas tão sombrias? Acabou adormecendo em sua cama sobre um livro. Sonhou que os condenados mutilados eram levados a um laboratório macabro e mantidos animados por algumas horas, para depois serem devolvidos ao silêncio no rio. 

Afonso Lima





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